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17 de Maio de 2024

A legitimidade do poder político: revisitando as teorias contratualistas

Publicado por Marcio Morena Pinto
há 10 anos

Nem todo poder é político, e nem todo poder político implica necessariamente o uso da força, como assinala Bobbio (2010, p. 164). O uso da força é uma condição necessária, mas não suficiente para a existência do poder político.

Dessa feita, não é todo grupo social com condições de usar a força, até mesmo com continuidade, que exerce um poder político, haja vista a existência de diversas organizações criminosas que legitimam no uso da força sua base de existência, mas, obviamente, a exercem de forma ilegal.

Pode-se dizer que o poder político se refere ao domínio, faculdade ou jurisdição que se tem para mandar ou para executar uma ação que afeta aos demais, mesmo contra sua vontade, utilizando-se da força, caso seja necessária. Por conseguinte, atualmente caberá quase que exclusivamente ao Estado o exercício do poder político, e, consequentemente, o monopólio do uso legal da força.

O poder político assume a coordenação e a supremacia de todos os outros tipos de poder, constituindo-se no núcleo da ação política, submetendo todos os indivíduos à sua coercibilidade em virtude da crença em sua legitimidade. Nesse diapasão, no que se refere à legitimidade do poder político, ela deve derivar da necessidade de estabelecer-se a necessária convivência social, e desse modo, se toleraria um maior ou menor grau de dominação de um grupo sobre os demais com vista a essa finalidade estatal precípua.

Quando o poder é despersonalizado, ou seja, é trasladado à figura de um ente despersonalizado como o Estado, o que se nota é que fica facilitada a submissão e aceitação de suas determinações pelos indivíduos. Daí que o poder é considerado legítimo quando é aceito e existe a disposição de obediência por parte daqueles que não o detêm. Por outro lado, será ilegítimo quando exercido por indivíduos ou grupos sociais não aceitos pelos demais, e que impõem sua vontade sob uma resistência. (DIAS, 2010, p. 32).

Embora a força física seja uma condição necessária e exclusiva do poder, não é condição suficiente para a sua manutenção. Em outras palavras, o poder que apenas se sustenta na força não pode durar. Logo, esse poder também precisa ser legítimo, ou seja, ter o consentimento daqueles que o obedecem.

A noção de legitimidade é uma das chaves do problema do poder, como ressalta Duverger (1981, p. 15). Na maioria dos grupos sociais, os homens acreditam que o poder deve ter uma natureza específica, repousar sobre certos princípios, revestir-se de alguma forma, fundar-se sobre uma origem, etc., sendo legítimo apenas o poder que corresponda a uma determinada crença.

Podemos afirmar que a noção de legitimidade nas sociedades democráticas traduz-se como “consenso”, ou seja, a conformidade que existe em uma dada sociedade sobre suas estruturas, hierarquia, orientação, autoridade, governo, etc.

No período moderno, as teorias contratualistas tornaram-se célebre ao tentar explicar a legitimidade do poder político. Segundo essas teorias, o governo era tido como um produto concebido por um artifício humano, um corpo social cuja legitimação derivava da autorização das próprias pessoas que haviam firmado uma espécie de pacto que lhes permitiria garantir a própria sobrevivência em sociedade.

Em Hobbes, por exemplo, a legitimidade do governo deveria fundar-se na segurança física e, de acordo com Locke, na proteção dos direitos naturais e no respeito às leis instituídas.

Já para Rousseau (1964, p. 429), a autoridade política deveria ser legitimada em uma “vontade geral” do povo, único e verdadeiro soberano, não devendo trasladar-se a um corpo político. Segundo ele: “A soberania não pode ser representada pela mesma razão porque não pode ser alienada, ela consiste essencialmente na vontade geral e a vontade absolutamente não se representa”.

O conceito de legitimidade do Estado idealizado por Rousseau e que se funda no exercício da soberania popular é adotado até os dias de hoje pelos países de civilização ocidental e que adotam o sistema democrático, associando-se o poder legítimo ao governo que atende aos preceitos de uma carta constitucional e, portanto, aos anseios do seu povo, verdadeiro soberano e detentor do poder.

Referências bibliográficas

DIAS, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Atlas, 2010.

DUVERGER, Maurice. Ciência política:teoria e método. 3. Ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Oeuvres complètes. Paris: Gallimard (Bibliotèque de la Pléiade), 1964. V. 3.

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